sábado, 5 de março de 2011

Pilares de Areia

São nos momentos derradeiros que revelamos quem realmente somos.”
Coringa, em The Dark Knight

Quando as trevas vierem à tona e a luz não ser nada mais do que uma distante lembrança, a vida nada mais será do que a face sorridente e iluminada da morte.”
Autor desconhecido


Em 2012 a Rússia desenvolvera a cura do câncer. Finalmente, depois de muitos anos de intensa pesquisa, o mundo se livraria dessa maldição. A cura havia elevado a Rússia a posto de maior potência do mundo. Graças a pesados investimentos de magnatas e investidores do leste europeu, a produção da vacina era em massa e acabar com o câncer seria apenas questão de tempo. Em 2015, o câncer fora extirpado completamente do planeta.
Em 2017 as conseqüências viriam à tona. Todos aqueles que foram vacinados e aqueles que com eles se relacionaram, começaram a apresentar um comportamento violento, revelando seus instintos mais primitivos, como a caça e uma hábil capacidade de raciocínio há tempos perdido com a extinção do Homem de Neanderthal. Sua alimentação se baseava em uma única coisa: carne humana.
Em meados de 2019 todas as grandes potências haviam sido destruídas por esses famigerados caçadores. Finalmente, em 2020, não havia lugar mais seguro do que a Austrália, por se situar entre os oceanos índico e pacífico. Um verdadeiro esquema de guerra se mobilizara na ilha, criando barricadas e fortalezas, cercadas de toneladas de arame farpado e trincheiras. Meses atrás o presidente dos EUA, última potência a ruir diante dos acontecimentos, enviara uma equipe de pesquisadores, juntamente com sua própria filha, para iniciarem um estudo e desenvolverem uma cura para essa terrível catástrofe. Resta agora somente a esperança de acabar com essa hecatombe, no entanto a esperança está ruindo feito à última morada segura: a Austrália.



Quando o presidente dos EUA decidiu enviar uma equipe de pesquisadores, não tinha levado em consideração o fato de serem os últimos cientistas gabaritados do planeta. Se algo ocorresse com eles, a salvação nunca chegaria e a extinção estaria próxima de se tornar realidade. Ashley Stuart, sua filha de 23 anos e bem mais precioso que ele já tivera na vida, fora levada junto aos pesquisadores para sua própria segurança, se afastando da desgraça que fora acometido seu país. Agora ela residia na fortaleza mais protegida da Austrália, juntamente com o presidente da mesma e todos os pesquisadores enviados de todas as partes do mundo.
Era impossível entrar ou sair da ilha. Qualquer esforço seria brutalmente reprimido pelo exército. Mas não naquele 18 de março de 2020...
Navegando a poucos quilômetros de distância, se encontrava um pequeno barco tripulado por apenas um homem, um jovem de 25 anos chamado Alex Timbalomatev, um dos poucos ou talvez o único sobrevivente da Rússia. Durante os anos que se seguiram após a terrível catástrofe, Alex, juntamente com seu pai, começou a desenvolver um antídoto que devolveria as propriedades humanas aos infectados. Durante três longos anos, pai e filho batalharam para concretizar a solução. Três longos anos escondidos em um abrigo subterrâneo, sozinhos e carregando a esperança da humanidade em suas mãos. Quando finalmente o antídoto fora terminado, Alex decidiu rumar em direção ao último centro que conseguiria aprimorar seu projeto, a Austrália. Deixando seu pai na Rússia, o jovem carregaria todo o destino da humanidade nas mãos. Após rumar sozinho por quatro meses até a última fronteira que abrigava vida, Alex chegaria à ilha.
Na manhã de 18 de março, uma grande chuva caíra sobre a Austrália e com ela trouxe uma surpresa. Um pequeno barco amanheceu aportado na praia em que se encontrava a base de operações de pesquisa. Alex é abordado pelo exército e levado para a base de pesquisa onde ficaria em quarentena. O medo que tomara a ilha era absurdo. Como alguém poderia ter entrado, nessas atuais condições, no lugar mais seguro do planeta?
Passado o tempo de isolamento, Alex foi liberado para falar com o presidente da Austrália. Após difundir suas idéias, o jovem é tido como a maior esperança que já havia surgido nos últimos anos. Com a concessão do presidente, Alex passaria a trabalhar com os cientistas e residir junto com eles. Porém, sua presença não era bem vista por todos. Os mais fanáticos diziam que ele seria o propagador da desgraça, o enunciador do fim dos tempos. Alex certamente seria o enunciador do fim dos tempos, o fim dos tempos sombrios. Trabalhando em conjunto com os cientistas, a estimativa de conclusão da vacina girava em torno de quatro meses.
Ashley nunca tinha conhecido o amor antes, e sentia que o momento se aproximava. Mesmo não se relacionando muito com Alex, o que ela sentia era forte e verdadeiro. A garota não tinha certeza se ele sentia o mesmo. Mas o que mais importava no momento era a resolução da tragédia, pensava Ashley. Passados três meses, o antídoto estava em fase final de conclusão. Agora só era necessário testar em algum espécime. Mas o que ninguém esperava naquele momento seria o aparecimento de algum famigerado sub-humano na ilha. O que ninguém sabia, no entanto, é que isso acontecia agora mesmo, bem embaixo de seus narizes entupidos com a terrível seca da região australiana.
O primeiro indício de que a infecção se desenvolvera no país seria visto à noite, mas seria destruído pelo exército. Já não havia mais tempo para testes e a resposta viria de modo surpreendente. No entanto, ficava uma dúvida pairando sobre o ar. Como seria feita a propagação da cura? Esse foi o erro de Alex. O jovem estava muito confiante com a cura que se esquecera de que modo ela seria propagada por todo o mundo. A única coisa que ele sabia nesse momento era que amava Ashley.
Os dois ficariam juntos tranqüilamente por apenas dois dias, quando começaria a tomada da Austrália. O ataque em massa proveniente dos caçadores sub-humanos ocasionou o fim da proteção. O exército estava morto, todos os habitantes da ilha infectados. Apenas quem estava dentro da fortaleza seguia vivo. Apesar de ter a solução dos problemas na mão, Alex não sabia como usá-lo. Mesmo que o antídoto fosse aplicado nos sub-humanos, o efeito não seria obtido imediatamente, mas sim em questão de meses, até anos. O grupo sobrevivente é cercado na fortaleza. Já não havia mais escapatória.
Alex e os sobreviventes se abrigam em uma base subterrânea localizada abaixo da fortaleza. O local era impenetrável e uma vez que a porta fosse lacrada, sair ou entrar seria impossível. Dentro da base era possível viver 20 anos tranqüilamente. Mas o que mais surpreendeu Alex foi o projeto da máquina do tempo. O projeto de viagem no tempo foi pela primeira vez cogitado nos anos 90, contudo a tecnologia da época não permitia avanços promissores. Reaberto em 2008, o projeto se fez da aliança entre EUA e Austrália e foi desenvolvido secretamente por todos esses anos. Quando a máquina estava para ser concluída, os acontecimentos resultantes da infecção mundial impediram sua conclusão. Desde então o projeto se encontrava abandonado onde agora se encontravam os sobreviventes
Os equipamentos que se encontravam presentes na base eram o suficiente para conclusão do projeto. Em uma última tentativa de salvar toda a humanidade, os 8 pesquisadores sobreviventes, Alex e Ashley começam o término do projeto. O projeto lhes consumiria 5 anos. Durante todo esse tempo um a um os sobreviventes foram morrendo. O relacionamento de Alex com Ashley ruíra completamente, a ponto de nem se olharem mais. O trabalho era mais importante e o tempo corria velozmente. Ashley entrou em depressão e após quatro anos morreu de desgosto. Alex ficou louco. A solidão, o confinamento, os corpos dos mortos que agora jaziam a sua frente e as lembranças de sua amada contribuíram para seu descontrole.
Finalmente, em 2025, a máquina estava pronta, voltando no tempo Alex teria a chance de impedir que o projeto de cura do câncer fosse concluído. Ajustando a máquina para 2012, o jovem retorna a sua terra natal, a Rússia. Desesperadamente Alex entra em contado com o presidente da Rússia e o presidente majoritário da corporação que desenvolvia no momento a cura do câncer. Mesmo colocando-os a par dos fatos que aconteceriam no futuro, suas palavras não serviram para nada, segundo eles seria apenas mais um lunático que diria não ser possível desafiar o poder divino. Viagens no tempo não existiam. Totalmente abismado com a reação de ambos, Alex atinge o limite de sua loucura, armando uma bomba para destruir o complexo onde as vacinas eram desenvolvidas. Seu plano vai por água a baixo. Alex é pego durante a operação e condenado à prisão perpétua por crimes contra a pátria.
Exilado na prisão de segurança máxima da Sibéria, Alex se rende ao destino. Nunca mais veria o mundo como via agora. Nunca mais sentiria o amor. Apenas sentiria o vazio da dor. Sentado em sua cela escura e fria, Alex Timbalomatev espera o fatídico dia em que a vida já não seria mais vista na Terra. Deixando rolar uma grande e pura lágrima de remorso, Alex fecha os olhos para si próprio, para a vida, para a morte, para o amor. Os pilares de areia que sustentavam o mundo finalmente ruiriam. Assim como a esperança do último dos homens.

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